segunda-feira, 7 de julho de 2014

Reconciliação - Ramos Horta

Acabo de ler o contributo recém publicado do irmão Ramos Horta no seu blog, discurso pronunciado na Birmânia, mas baseado na sua experiência na Guiné-Bissau (cujo sucesso lhe permite extrapolar para o sudeste asiático), com o título de «Reconciliar comunidades, construir uma paz durável». O enviado do Secretário Geral das Nações Unidas é bastante assertivo e refere, como factor-chave da sua actuação, uma importante decisão: «and we decided not to be hostage of the past, not to succumb to anger».

1) As feridas da guerra de 7 de Junho de 1998 levaram muito tempo a sarar e a Guiné-Bissau viveu anos de uma violência inaudita.

2) Muitos dos responsáveis por essa espiral de violência estão hoje mortos, logo inimputáveis

3) Face a esse estado de coisas, muitos actos de violência ocorreram, desde actos preventivos a que erradamente chamaram golpe de estado, a actos de legítima defesa com graves implicações

Interessa-me aqui apresentar o caso do Comodoro Lamine Sanhá, comandante da Junta e mártir da República. Depois de escapar por um triz a uma tentativa de eliminação física explicitamente comanditada pelo então CEMFA, denunciou publicamente a injusta perseguição de que estava a ser alvo por parte de Tagma. Vamos admitir que o Comodoro, em vez de estoicamente se deixar matar como Santo na praça, tinha decidido actuar para defender a sua vida, mesmo que isso implicasse a morte de um Chefe de Estado Maior. Quando acusado, se confessasse, poderia ser condenado pelo seu acto, que não configura outra coisa senão a mais elementar legítima defesa?

Pretender julgar isoladamente os crimes de «motivação política» (mas muitas vezes de contornos demasiado pessoais), arrisca-se a ser um ingrato e infindável desenterrar de cadáveres nos armários. Algo parecido com uma troca simbólica parece obrigatório: trocar o passado pelo futuro em aberto. Quando se convida alguém para um petisco, a primeira coisa a fazer é limpar a mesa: ok, meus senhores, compreendemos que até aqui as coisas foram assim, vamos passar a esponja, mas a partir daqui, vamos funcionar a sério: que nos sirvam de exemplo os erros do passado, para dar valor ao entendimento e a uma verdadeira reconciliação em torno de uma afirmação identitária e da construção, desde a estaca zero, do Estado.


Saúdo o gesto de esperança do meu amigo Melcíades Fernandes, que escolheu este momento para abandonar o seu exílio forçado nas instalações da União Europeia, e congratulo-me que o Bambaram di Padida (ver link ao lado direito) tenha utilizado uma foto minha para ilustrar a notícia, de Manel Mina no seu cockpit! Ver fonte.

Sem comentários: